Da ilegalidade na terceirização de mão-de-obra no âmbito da administração pública quando comprovada sua realização durante o período de validade do concurso público

Um tema que desperta grande interesse no mundo dos concursos é a inquietante situação em que a Administração Pública direta ou indireta realiza, mediante terceirização, contratação de profissionais para cargos em vacância, enquanto válido e ainda vigente o concurso público.

Em diversos casos essas terceirizações são efetuadas de maneira ininterrupta, sendo somados inúmeros termos aditivos aos contratos, em evidente violação aos dispositivos constitucionais que enunciam a necessidade de concurso público para execução de cargos e empregos públicos, frustrando assim as justas aspirações dos aprovados no concurso.

Em síntese, os argumentos utilizados pelos entes públicos que realizam essas terceirizações  são, de modo geral, sempre os mesmos, quais sejam: o custo para manter as contratações é menor – atendendo o princípio da economia da administração pública – e que a mão-de-obra seria tão eficiente quanto.

Estas argumentações afrontam diversos princípios constitucionais, ferindo as normas que regem o serviço público.

Isso porque o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal determina que “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.”

Neste diapasão, resta evidente que a realização do concurso público não é uma faculdade da Administração Pública e sim sua obrigação/dever.

De acordo com os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles, o concurso público, além de constituir requisito de legitimidade da investidura em cargo público efetivo, prestigia a moralidade, impessoalidade e eficiência da Administração Pública.[1]

Esse filtro de contratação de servidor tem desmedida importância, uma vez que, além de primar pelos princípios norteadores do direito administrativo, garante a lisura dos procedimentos, evitando escândalos de desvio de verbas públicas – vide caso identificado no Ministério dos Transportes em meados de 2011, por exemplo – e/ou troca de favores que não condizem com o interesse público.

Assim, a contratação terceirizada Não viola apenas o direito adquirido do candidato aprovado, mas a preservação da garantia constitucional da cidadania contra as preferências pessoais e os riscos resultantes de contratos milionários que permitem o acesso indireto à investidura em cargo efetivo.

O legislador, ao proteger as carreiras públicas determinando que a investidura em cargos públicos seja de maneira qualificada, deixou claro seu repúdio a terceirizações e execuções indiretas.

Ademais, inequívoco que a Administração Pública, ao afastar candidatos regularmente aprovados no certame para uma desvirtuada preferência por terceirizados, viola o princípio da eficiência, pois expurga a lógica do mais preparado em benefício da escolha de terceirizados contratados por empresa privada.

Como se não bastasse a obviedade dos dispositivos normativos, grande parte da jurisprudência vem respaldando o entendimento supra, aduzindo, ainda, que a preterição de candidatos aprovados em concurso público para contratação de terceirizados configura violação aos princípios da legalidade, publicidade, isonomia, razoabilidade, moralidade, eficiência, boa-fé e segurança jurídica, haja vista os candidatos preteridos terem direito subjetivo, líquido e certo, à nomeação.[2] [3] [4]

Nestes casos, entende-se que essa preterição é inconstitucional, haja vista ter sido subvertida a ordem constitucional de investidura em cargos efetivos, e que se faz necessário o provimento jurisdicional, em caráter urgente (pedido de tutela antecipada), pois o iminente esgotamento do prazo de validade do concurso afastará a convocação dos candidatos devidamente aprovados.

Destarte, comprovada a terceirização no período de validade do concurso público, é possível intentar medida judicial pleiteando que a Administração Pública nomeie imediatamente o candidato ou, sucessivamente, ao menos, assegure reserva de vaga até decisão final da demanda.

[1] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 32ª edição. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 434.

[2] AI 440895 AgR, 1ª Turma do STF, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, DJ 20.10.2006.

[3] RMS 16.195, 6ª Turma do STJ, Relatora: Min. Maria Thereza, DJe 23.03.2009.

[4] AMS 2002.38.03.000957-4, 5ª Turma do TRF1, Relator Des. Federal Fagundes de Deus, e-DJF1 16.10.2009.

Por Francisco Paraíso Ribeiro de Paiva

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