Concurso público cujo certame é dividido em regiões: hipóteses de preterição do candidato

Há alguns meses atrás, uma candidata impetrou mandado de segurança[1], com pedido de liminar, perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em razão da não convocação para participar da segunda fase do concurso público. Inscrita para concorrer para uma região específica, a candidata conquistou a pontuação de 6,972.  Porém, a nota de corte na região onde ela se inscreveu foi de 8,111, o que levou a Banca Examinadora do certame não convocar a candidata para a segunda fase.

De acordo com a candidata, o caso configuraria preterição, em razão dela possuir nota suficiente para realizar a segunda fase do concurso público, se comparada às notas de corte das demais regiões. Além disso, a classificação por regiões, como prevista no edital, afrontaria o princípio constitucional da isonomia, e frustraria o caráter competitivo do certame. Daí, o suposto direito alegado pela candidata de realizar a segunda fase do concurso, tendo em vista possuir nota superior às notas alcançadas pelos candidatos das demais regiões, à exceção da região para a qual se inscreveu.

O assunto acima não é novo para o STJ, que possui entendimento pacífico (e semelhante ao do STF), no sentido de que essa questão exige a análise cuidadosa do caso concreto. Porém, o exame dos atos da Banca Examinadora e das normas do edital, pelo Judiciário, deverá ficar restrito aos princípios da legalidade e da vinculação ao edital.[2] Em outras palavras, inexiste a possibilidade de o Judiciário substituir o administrador público no exercício de suas funções, em razão da separação dos poderes.

Além disso, para o STJ, não há ilegalidade em edital que, respeitada a Constituição Federal, estabelece critério de regionalização para realização de concurso público, a fim de atender às necessidades do serviço, não sendo pertinente falar em preterição ou ilegalidade.[3]

No caso da candidata, que impetrou o mandado de segurança, o STJ entendeu que o edital trouxe, com clareza e sem qualquer ambiguidade, que o candidato seria aprovado dentro da região para a qual concorreu, sendo elaborada uma lista de aprovados dentro da respectiva região e uma lista geral com todos os aprovados identificados por região, listagem essa que poderia ser acionada para aproveitamento de um candidato para região fora da sua opção, quando não houvesse mais remanescentes na região respectiva. Então, a partir de daí, é que poderiam ser nomeados os candidatos classificados, desconsiderando suas opções no momento da inscrição no certame.

Assim sendo, concluiu-se que a candidata não foi aprovada na primeira fase do concurso, porque não figurou, em sua região, entre o número previsto de posições com direito a prosseguir na segunda fase do concurso, conforme disposição do edital. Por consequência, a possibilidade de aproveitamento da candidata fora de sua região de opção, bem como a suposta preterição, restaram afastadas, e com isso, indeferida a liminar pelo STJ.

Por Karin Prediger


 

[1] STJ: MS nº 19.962/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 01/04/2013.

[2] CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – CARTÓRIO – CONCURSO DE REMOÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA – LEGITIMIDADE DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO – EDITAL DE CONCURSO – LEGISLAÇÃO SUPERVENIENTE – MODIFICAÇÃO – POSSIBILIDADE.

  1. Caso seja acolhida a pretensão do recorrente, o que se noticia somente como hipótese, a autoridade competente para modificar o edital, adequando-o à Lei n. 10.506/02, será o Exmo. Sr. Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Ora, se ele é quem poderá modificar o edital, logo possui legitimidade passiva para figurar no presente mandamus.
  2. O Judiciário, quando realiza controle sobre concurso público, somente pode ater-se à verificação de observância do princípio da legalidade e da vinculação ao edital. Com efeito, uma das formas de respeito ao princípio da legalidade é a adequação do edital à legislação superveniente à abertura do concurso.
  3. ‘O edital é a lei do concurso, sendo vedado à Administração Pública alterá-lo, salvo para, em razão do princípio da legalidade, ajustá-lo à nova legislação, enquanto não concluído e homologado o certame.’ (RMS 13578/MT, Rel. Min. Vicente Leal, DJ 12.8.2003). Recurso ordinário provido.” (RMS 17.541/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 15.4.2008, DJe 25.4.2008.) (STJ, RMS 17.541/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 15/04/2008, DJe 25/04/2008).

[3] ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. CONCURSO. DILIGÊNCIA PARA JUNTADA DE DOCUMENTOS DESNECESSÁRIA. MÉRITO. CURSO DE FORMAÇÃO. APROVAÇÃO FORA DAS VAGAS. APROVEITAMENTO. REGRA DO EDITAL QUE VEDA POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DA LEGALIDADE OU ISONOMIA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

  1. Cuida-se de recurso ordinário contra acórdão que denegou a segurança em writ que postulava o direito de a candidata permanecer no certame, apesar de não ter alcançado classificação, nem ter sido beneficiada por decisão judicial. Foi aprovada em 33ª colocação e havia somente 28 vagas para a segunda fase. Argumenta que teria direito se não fosse considerado o item 10.5, do Edital, que dividiu o certame por Regiões.
  2. A recorrente alega que foi incluída no curso de formação, apesar de não ter sido classificada para tanto, nem tampouco ter sido beneficiada por medida liminar. Não há direito líquido e certo a amparar candidato aprovado fora do quantitativo de vagas. Precedente: EDcl no AgRg no RMS 33.303/BA, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 10.8.2011. Logo, dispensável diligência – porque desnecessária – para comprovar a aprovação na segunda fase, se não houve classificação na primeira.
  1. “Esta Corte tem entendido que não há ilegalidade em edital que,respeitada a Constituição Federal, estabelece critério, de regionalização para realização de concurso público” (AgRg no REsp 1.005.213/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 16.2.2009). No mesmo sentido: MS 15.092/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 31.3.2011. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no RMS 34.381/GO, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 03/11/2011, DJe 11/11/2011).

 

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