Quais os limites das bancas executoras quando aplicam a prova do concurso público?

Como se sabe, a Administração Pública possui o poder de atuar realizando atos que resultam em ingerência na esfera particular dos cidadãos, criando, extinguindo e modificando direitos.

Essas ações podem ter aspectos vinculados, ligados integralmente aos limites legais impostos ou podem ser discricionários, o que confere ao gestor/administrador certa liberdade na escolha das medidas possíveis.

No contexto do concurso público, podemos afirmar que a discricionariedade do ato do administrador/examinador se revela apenas na elaboração do edital, pois é quando esse agente público fixará as normas que melhor atenda aos seus interesses, devendo estar atento, entretanto, às normas constitucionais e legais, bem como aos princípios que regem a Administração Pública.

Uma vez delimitadas as regras do concurso, a esfera da discricionariedade do examinador termina e este deverá se ater às regras definidas no edital, sempre visando resguardar a finalidade do concurso público, qual seja, a seleção dos candidatos mais aptos para o serviço público.

Nesse sentido, as provas objetivas e discursivas não podem permitir a inauguração de matéria não tratada e prevista previamente em edital. Isso porque, admitir o contrário seria conceder, à banca executora, poder para, livremente, inaugurar em quaisquer matérias, sempre em prejuízo ao candidato.

No que tange à prova prática de taquigrafia, é necessário reforçar que o edital dispõe sobre o tempo e a velocidade média em que o ditado será realizado. Essas especificações são de extrema importância ao candidato que concorre ao cargo de taquígrafo, uma vez que é essa a característica que determina e delimita o grau de dificuldade da prova prática.

O mesmo raciocínio é aplicável às provas de títulos. Os critérios utilizados, os pontos atribuídos, o material aceito, sempre deve constar de forma clara, objetiva e pública no edital de abertura do certame.

Veja, portanto, que uma vez estabelecidas as regras do concurso público, não pode, a Administração, surpreender o candidato, devendo sempre estar atenta aos princípios que regem os seus atos.

Aliás, destaca-se que existem inúmeros precedentes judiciais que afirmam a necessidade de se observar, por exemplo, o princípio da legalidade que, na esfera da prova pública, consiste no respeito às regras editalícias, como se vê:

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. IMPUGNAÇÃO A QUESTÃO OBJETIVA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO CONFIGURAÇÃO. HOMOLOGAÇÃO DO RESULTADO FINAL DO CERTAME. PERDA DO OBJETO. NÃO OCORRÊNCIA.

CONTROLE JURISDICIONAL. ANULAÇÃO DE QUESTÃO OBJETIVA. POSSIBILIDADE NA HIPÓTESE DE VÍCIO EVIDENTE.

(…)

3. Na hipótese de flagrante ilegalidade de questão objetiva de prova de concurso público ou ausência de observância às regras previstas no edital, tem-se admitido sua anulação pelo Judiciário por ofensa ao princípio da legalidade. Precedentes do STJ.

4. Tendo a Corte de origem consignado pela anulação da matéria por comportar “erro manifesto e invencível”, prejudicando assim o candidato, rever tal entendimento implica reexame do contexto fático-probatório dos autos, o que é vedado em Recurso Especial ante o disposto na Súmula 7/STJ.

5. Agravo Regimental não provido.

(AgRg no AREsp 165.843/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2012, DJe 22/08/2012)

Nesse sentido, pode-se afirmar que quando se mantém íntegro o princípio da legalidade, ou seja, quando as regras do edital são preservadas e aplicadas, permite-se a preservação também dos princípios da moralidade, finalidade, boa-fé, segurança jurídica, dentre tantos outros que são alicerces do Estado Democrático de Direito.

Mas nem sempre o Edital do concurso público é um amigo do candidato. Isso porque, às vezes, as bancas executoras redigem as regras do certame de forma equivocada, gerando e permitindo justificadas confusões e ambiguidades que, em um determinado momento, podem prejudicar o candidato.

Nessas situações, o Poder Judiciário entende que a questão deverá ser resolvida por uma interpretação integrativa do Edital de abertura do concurso público, conferindo a  disposição mais benéfica ao candidato[1].


[1] TRF-2 – APELREEX: 446757 RJ 2007.51.01.016387-0, Relator: Desembargador Federal REIS FRIEDE, Data de Julgamento: 24/06/2009, SÉTIMA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: DJU – Data::03/07/2009 – Página::143

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